Cachorro

Cães viraram os novos "Nem-nem": a geração de pets que faz parte da família e tem até direitos perante a sociedade

Publicado - 22 Outubro 2024 - 11h02

Atualizado - 22 Outubro 2024 - 12h15

Foto da Laura Furtado - Redatora

Laura Furtado / Redatora

Jornalista em formação pela Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói. Desde pequena, sempre tive um amor e carinho especial por todos os animais. Quando completei 6 anos, meus pais me presentearam com um cãozinho da raça Bichon Frisé que chamamos de Billy. Foi o dia mais feliz da minha vida, fiquei horas chorando sem acreditar que ele era meu. Billy viveu 14 anos com a gente, mas virou uma estrelinha em 2019 depois de uma história linda ao nosso lado.

Em 2019, ganhei da minha sogra uma Dachshund, o famoso salsichinha, e desde então minha vida voltou a fazer sentido. Pode parecer clichê, mas nada explica o sentimento de amor e carinho que ter um pet proporciona. Nós decidimos chamar ela de Teteia, e não poderia existir nome melhor pra descrever ela. Teteia significa moça atraente, e a minha Teteia salsicha é realmente a coisa mais linda do mundo, além de ser extremamente carinhosa, companheira e engraçada.

Em 2023, participei de uma entrevista e entrei para o time do Patas da Casa. Fiquei muito feliz, porque sempre tive afinidade e carinho pelos animais, e não há nada melhor do que escrever sobre coisas que a gente ama, né. Me identifiquei de cara com os valores do Patas e sempre considerei o projeto de suma importância para tutores que, assim como eu, buscam se informar para garantir o melhor para os pets. Desde então, cada dia tem sido um aprendizado, e sou muito feliz por fazer parte de um projeto tão especial quanto o Patas.

• Filme com animal preferido: “Marley e Eu”
• Uma raça de cachorro: Vira-lata
• Uma raça de gato: Siamês
• A curiosidade favorita sobre cachorros: Os cães de suporte emocional podem agir como 'terapeutas', ajudando pacientes com ansiedade, depressão, autismo e estresse pós-traumático
• A curiosidade favorita sobre gatos: Os gatinhos tem efeitos positivos na sáude mental e física dos humanos
• Sobre o que mais gosta de escrever no universo pet: Comportamento animal
• Um aprendizado: Adotar cachorro ou gato pode mudar a vida das pessoas e dos animais para melhores, trazendo muito amor e felicidade
• Nome de pet favorito: Larica

Eles não precisam mais tomar conta da casa, correr atrás de motos, latir para o carteiro e nem viver no quintal 24h por dia. Também não são bravos e têm tudo o que querem, na hora que querem. Os cães da chamada geração “nem-nem” deixaram para trás o papel tradicional de proteção e agora são tratados como verdadeiros membros da família, com regalias, cuidados especiais e até direitos perante a sociedade e a justiça. Mas será que essa humanização dos pets, que lhes confere o título de “geração nutella”, está prejudicando a saúde e o bem-estar dos cachorros ou esse é um passo importante na luta dos direitos animais? Vamos te ajudar a chegar bem perto da resposta a essa pergunta com algumas informações sobre o assunto.

Saiba quem são os cãezinhos da geração “nem-nem”

Originalmente, o termo geração “nem-nem” é usado para referir-se aos jovens entre 18 e 24 anos que não estudam nem trabalham, mas aproveitam mordomias e privilégios na casa dos pais. Mas você sabia que no universo dos pets essa expressão ganhou um novo significado? Os cachorros da geração “nem-nem” estão seguindo a tradição desses jovens e vivendo uma verdadeira vida de rei, repleta de regalias.

Não é uma tarefa muito difícil identificar os cãezinhos integrantes da geração ”nem-nem”, e você com certeza já viu um desses por aí. São aqueles que recebem um tratamento humanizado - que muitos acreditam ser um pouco exagerado. Eles frequentam creche para cachorro, têm plano de saúde, consomem produtos super premium, usam roupinhas e acessórios extravagantes, fazem “spa-day” e até andam de carrinho como os bebês.

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Mas não para por aí! O comportamento dos cães da geração “nem-nem” também tem tudo a ver com a geração original dos jovens “nem-nem”. Eles são mimados (não no sentido negativo) e recebem carinho e atenção quando desejam. Passam o dia inteiro dormindo, e quando acordam, só se preocupam em brincar ou comer. 

Recentemente, essa constatação virou meme nas redes sociais e tutores passaram a compartilhar a rotina de seus cães da geração “nem-nem”: 
 

 

Cientistas acreditam que os cães “nem-nem” são fruto da geração de jovens millennial

Há cerca de 20 anos, os cães já eram vistos como companheiros leais e amorosos, mas cumpriam papéis e respeitavam limites impostos pelas famílias. Muitos eram adotados ou comprados para desempenhar a função de cão de guarda, vivendo nos quintais para proteger o território de possíveis ameaças. Embora fossem bem cuidados e tratados, haviam restrições em relação ao seu lugar dentro da família humana.

Hoje, porém, esse tratamento mudou radicalmente. Os cães que antes viviam nos quintais, agora ocupam o sofá da sala e são tratados como membros VIP’s das famílias, marcando o início de uma era de humanização dos animais. Cientistas de todo mundo acreditam que esse fenômeno começou com a geração Y, os millennials, composta por pessoas nascidas entre 1982 e 1994. Mas qual será o motivo dessa associação?

Uma pesquisa publicada na ResearchGate parece que descobriu a resposta. Para os cientistas, esse cuidado exagerado e humanizado com os cães reflete o estado emocional dos jovens adultos dessa geração. De acordo com eles, os millenials tendem a tratar os animais de estimação de maneira ‘exagerada’ para suprir as próprias necessidades emocionais e de cuidados. Mais do que qualquer geração anterior, os millenials demonstraram o desejo de humanizar os pets e dar o melhor a eles, seja oferecendo alimentos saudáveis, cuidados de primeira, brinquedos interativos de alta qualidade, contratando passeadores de cães e até levando os peludos para creche.

Isso faz total sentido se formos analisar como essa geração tem vivido. Diferente da geração dos pais, esses jovens estão adiando, ou até desistindo, de comportamentos tradicionais da vida adulta, como casar e ter filhos. Nesse contexto, os cães assumem um papel de preencher o vazio de uma identidade familiar que essa geração busca. Eles concluíram que os adultos emergentes da geração Y consideram os animais de estimação como seus filhos, o que tem um impacto positivo na vida desses jovens, principalmente quando se trata de saúde mental.  

O problema por trás da humanização dos animais

A humanização dos animais é um tema que sempre gerou bastante polêmica no universo pet. De um lado, tutores que tratam os animais de estimação como se fossem filhos defendem que os pets devem receber o melhor que eles podem oferecer, inclusive tratamentos que não refletem as necessidades naturais da espécie. Por outro, muitas pessoas acreditam que essa humanização de cães e gatos é exagerada e cheia de consequências negativas para a vida dos pets.

Embora muitos tutores tratem seus animais de estimação como membros da família, proporcionando a eles mimos, roupas para cachorro e até dietas sofisticadas, especialistas alertam para os riscos desse comportamento. Humanizar um pet, embora possa parecer um gesto de carinho e amor, pode trazer consequências negativas tanto para o animal quanto para os tutores.

De acordo com especialistas, a humanização excessiva dos animais pode causar o efeito contrário que os tutores buscam. Ao projetar necessidades humanas nos pets, os tutores podem ignorar algumas características e instintos naturais das espécies que são importantes para o bem-estar físico e emocional do animal. O sapato para cachorro, por exemplo, apesar de ser um acessório bacana para evitar sujeira, impede que o animal consiga sentir o chão e manifeste comportamentos naturais, como correr, explorar e arranhar. O sapato ainda pode deixar o pet desconfortável e aumenta as chances de proliferação de fungos e bactérias. Tudo isso pode acabar deixando o cachorro estressado e reprimido, o que não é nada bom para o seu bem-estar.

cachorro usando roupa
As roupas para cachorro são uma característica da humanização dos animais

Inclusive, a humanização dos animais é um dos principais causadores da ansiedade de separação de cachorro. Especialistas acreditam que os cuidados e a atenção exagerada que recebem influenciam no estado emocional do cão, especialmente quando o tutor precisa se ausentar.  Como eles são acostumados a receberem toda atenção do mundo, alguns pets não sabem lidar muito bem com a ausência do tutor e podem apresentar dificuldades em ficar sozinho. Quando os tutores saem, os cães com ansiedade de separação geralmente latem excessivamente, uivam e apresentam comportamentos destrutivos, o que só reforça que eles estão se sentindo ansiosos e insatisfeitos.

Por outro lado, a humanização dos cães também pode trazer benefícios

Contudo, é importante entender que a humanização dos animais não é totalmente negativa. Ela também pode trazer benefícios positivos para os cães e os tutores, contribuindo para uma relação mais próxima e forte entre eles. Mas como tudo na vida, é preciso que isso seja feito com equilíbrio. Afinal, os cachorros não são humanos: eles apresentam necessidades e características próprias da espécie que precisam ser respeitadas.

Um exemplo é em relação às vestimentas dos animais. Você até pode usar roupa para cachorro no pet, especialmente nos dias mais frios, desde que eles se sintam confortáveis usando o acessório. Você também pode deitar com o peludo na sua cama, desde que não incentive a dependência emocional.

É por isso que é fundamental estabelecer limites e estimular a independência do animal para que ele aprenda a viver ‘sozinho’ e não sinta falta do dono em sua ausência. Isso não significa dizer que você não deve oferecer amor, carinho e uma rotina de cuidados aos pets, mas que você reconheça as necessidades físicas e emocionais dos cães como animais, e não como humanos.

Para isso, você deve criar um ambiente com tudo que o animal precisa para ser feliz, inclusive com uma caminha para cachorro, para que ele saiba que aquele local é destinado para os descansos dele. Você também deve investir em brinquedos interativos para cachorro para que eles possam se divertir quando você não estiver em casa. 

homem beijando cachorro
A humanização de animais não tem problema, desde que exista um certo equilíbrio 

E tudo isso chega a uma conclusão: parece que os cães estão entrando em nova fase evolutiva

Ao longo dos anos, cientistas têm pesquisado sobre os efeitos da humanização dos animais a longo prazo, e parece que eles descobriram a resposta. Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Linköping, na Suécia, publicado na Science Direct, revelou que os cães podem estar chegando na terceira onda de domesticação. De acordo com os cientistas, isso estaria sendo motivado pelo desejo dos humanos por animais de estimação que sejam mais tranquilos, amigáveis e apropriados para um estilo de vida mais sedentário.

Mas será que o tratamento humanizado oferecido aos animais de estimação pode ter influenciado na chegada da terceira onda de domesticação? É bem provável que sim! Acontece que a relação entre o cachorro e humano não é mais a mesma, pois espera-se que os peludos adotem comportamentos cada vez mais humanizados. Como consequência, os humanos e cães apresentam uma conexão emocional muito mais forte do que antigamente, e isso tem tudo a ver com a liberação da ocitocina, conhecido popularmente como "hormônio do amor”. A ciência acredita que esse hormônio é responsável pelo vínculo social entre cães e humanos, já que os níveis de ocitocina no organismo aumentam quando um animal de estimação mantêm contato visual prolongado com o dono.

Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores realizaram um teste comportamental com 60 cachorros da raça Golden Retriever. Eles testaram o comportamento dos cães ao usar dois tipos de sprays nasais: um com ocitocina (um hormônio relacionado ao vínculo e confiança) e outro com uma solução salina neutra (sem efeito). Os pesquisadores observaram que, após receber um spray nasal com ocitocina, os cães com uma variação genética específica se mostraram mais propensos a pedir ajuda aos donos quando enfrentavam uma tarefa difícil (abrir um pote), em comparação a quando receberam o spray neutro.

Eles concluíram que a ocitocina aumentou as habilidades sociais desses cães, reforçando a ideia de que, ao longo do processo de domesticação, os cães desenvolveram mudanças genéticas que melhoraram a forma como interagem com os humanos. A grande questão é que talvez essa nova fase evolutiva dos cães tenha total relação com a humanização dos animais.

Na primeira fase da evolução canina, os cães eram valorizados pela suas habilidades de caça, proteção e trabalho. Nessa última, os cães estariam sendo valorizados pela companhia e os laços que criam os tutores, o que está diretamente ligado a humanização dos cães. Ou seja, o foco na humanização na criação de cães para que eles se ajustem ao mundo humano está moldando tanto a parte comportamental quanto biológica.

O mercado pet se aproveitou da geração de cães “nem-nem”

Quem mais se beneficia da humanização dos animais é o mercado pet. De acordo com a ABINPET, Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação, esse mercado registrou um faturamento 11,65% maior em 2023 em relação ao ano anterior. E a geração millennials é, sem dúvidas, um dos grandes impulsionadores do crescimento da indústria de animais de estimação.

Empresários de todo o mundo perceberam que os tutores passaram a investir mais em produtos e serviços que antes eram considerados desnecessários ou luxuosos, e isso tem tudo a ver com a humanização dos animais. Para se ter uma ideia, marcas grife renomadas e reconhecidas no mundo todo já se deram ao luxo (literalmente) de criar produtos para cães e gatos.

A Gucci, por exemplo, uma das marcas de grife mais reconhecidas no mundo todo, recentemente lançou uma coleção para pets que vende vários acessórios luxuosos e bem caros. Em seu catálogo, eles expõem uma variedade de coleiras para cachorro, guias, roupinhas, bolsas e potes para refeição. Marcas de produtos dermatológicos nacionais e internacionais também se aproveitam dessa onda para lançar coleções de shampoo, condicionador e até perfume para cachorro. O mesmo vale para os serviços, já que os tutores estão buscando cada vez mais creches para cachorro, planos de saúde, adestradores e serviços de passeio.

A Lei reconhece que animais de estimação não são objetos  

Não é só o tratamento com os cães que vêm mudando ao longo dos anos: a maneira como os cães e gatos são vistos pela legislação brasileira também está passando por uma transformação significativa. Até o ano de 2019, os animais eram tratados pela Justiça como bens semoventes, ou seja, objetos com valor econômico. No entanto, após um projeto de lei que percorreu a Câmara dos Deputados, os animais (cães e gatos) deixaram de ser considerados objetos, ganhando uma natureza jurídica 'sui generis', que significa que eles são reconhecidos como sujeitos de direitos despersonificados. Na prática, o projeto reconheceu os animais como seres sencientes, ou seja, que têm sentimentos, com propósito de garantir que os animais tenham proteção jurídica contra maus-tratos e crueldade.  

Vale dizer que a luta pelos direitos dos animais é de longa data, e várias coisas já foram conquistadas. A mais famosa e a mais importante de todas é a Lei de maus-tratos a animais, que prevê a proteção e garante que qualquer ato de agressão seja tratado como crime. 

As mudanças na legislação que visam garantir a integridade e os direitos dos animais talvez tenham ainda mais força atualmente, já que os animais passaram a ser reconhecidos como parte importante da família e têm quem lute por eles. Mas ainda existe um longo caminho quando se fala de animais que vivem na rua e até no processo de criação de algumas raças. De uma forma ou de outra, o que importa é que a nova geração “nem-nem” não está recebendo apenas um tratamento mais especial em casa, como também está conquistando mais direitos na sociedade.

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