O transplante de fezes em animais é uma prática pouco conhecida, mas que pode trazer muitos benefícios ao sistema digestivo do cachorro ou gato. O procedimento é recomendado para cuidar de problemas intestinais de pets que não respondem aos tratamentos convencionais. Fundamental em diversos processos do organismo do seu pet, uma flora intestinal saudável pode ser a solução contra diversas patologias causadas por vírus e bactérias que afetam o intestino.
Provavelmente você nem sabia que era possível fazer um transplante de fezes em gatos, cachorros e outras espécies animais. Para entender mais sobre o procedimento, o Patas da Casa conversou com a médica veterinária e professora na Universidade Federal de Lavras (UFLA), Dra. Flávia Borges, que orientou uma pesquisa bem completa sobre o transplante fecal de cães e gatos.
Quando o transplante de fezes em pets é indicado?
De acordo com Flávia, o transplante de fezes em pets não é muito diferente do realizado em humanos. Mas na medicina veterinária integrativa, essa prática só ganhou mais força nos últimos anos. Em resumo, ela diz que o procedimento visa uma transferência de microbiota para tratar algumas doenças e impacta diretamente na melhora de funcionamento do sistema digestivo do gato ou cachorro.
As microbiotas são microorganismos que residem no trato digestivo dos animais e têm um papel importante em manter essa barreira imune, fornecendo ácidos graxos que serão fontes de energia para as células intestinais. Mas quando há uma disbiose (quando a microbiota intestinal está sofrendo algum desequilíbrio de bactérias), essa barreira fica comprometida.
“O transplante consiste em substituir uma microbiota dominante em quadros de disbiose , implantando uma outra, em condições normais, que são encontradas em animais saudáveis (em eubiose). As indicações são desde animais com doença inflamatória intestinal, colites, diarreias crônicas não responsivas a tratamentos convencionais
Transplante fecal em pets melhora a saúde em geral
O transplante de fezes serve para solucionar problemas que vão além do gato ou cachorro com diarreia: “Uma microbiota saudável pode ser uma terapia integrativa para solucionar problemas dermatológicos, por exemplo". Segundo ela, "animais atópicos, com hepatopatias [doenças crônicas do fígado] e nefropatias [doenças crônicas renais]" também se beneficiam do procedimento.
Inclusive, um trato intestinal saudável tem influência na imunidade e no sistema nervoso. “Cerca de 90% da produção de serotonina vem do intestino a partir de células neuronais que atuam de forma independente daquelas do cérebro. E o intestino é uma das barreiras imunológicas mais efetivas em identificação e eliminação de patógenos e também tem um complexo sistema de produção de interleucinas, citocinas pró e anti-inflamatórias e imunoglobulina (IgA).”
Transplante de fezes: como é feito o procedimento?
A resposta para essa pergunta está em uma recente revisão sobre o Transplante de Microbiota Intestinal (TMI), realizada pela veterinária Juliana Franco, que recebeu a orientação da Dra. Flávia em parceria com a também veterinária Luciana Agostini: “(O transplante) é a infusão de uma suspensão de fezes, isto é, de microrganismos vivos e em quantidade suficiente, vindos de indivíduo saudável, no tubo digestivo de um indivíduo enfermo. O TMI também pode ser chamado de: bacterioterapia fecal, repovoação fecal, recuperação e fortalecimento da flora intestinal, transferência de microbiota intestinal”.
Nos humanos, esse tipo de transplante é feito por meio de cápsulas orais. Nos animais, entretanto, o processo é um pouco diferente: “As fezes do doador devem ser implantadas frescas no cão receptor, através de uma suspensão de água mineral e fezes aplicadas no cólon com auxílio de uma seringa grande de 20 a 60 ml, em função do tamanho do animal a ser transplantado. As fezes podem ser utilizadas frescas ou congeladas, porém alguns estudos relatam que, quando frescas, são mais eficazes.”
Pet que recebeu o transplante de microbiota deve seguir uma dieta rigorosa
Os cuidados com a alimentação dos cachorros e gatos devem ser redobrados depois do transplante fecal. Isso porque o funcionamento da microbiota intestinal é totalmente influenciado pela dieta do anima: “A manutenção da microbiota é de extrema importância. Há o uso de fibras que possuam uma boa proporção de solúveis e insolúveis. Também há a diminuição de carboidratos simples e de proteína de baixa digestibilidade, para evitar uma fermentação excessiva no trato gastrointestinal”
Isso acontece porque, segundo a pesquisa de Juliana Franzo, os animais também possuem dois filos de bactérias chamadas de bacteroidetes (bactérias gram-negativas) e firmicutes (bactérias gram-positivas) - ou seja, é bem parecido com o intestino humano. Uma dieta rica em carboidratos simples e gorduras saturadas e pobre em nutrientes, assim como a ingestão de muitas calorias, vai atrapalhar os resultados do tratamento.
Flávia recomenda que os animais transplantados sejam acompanhados por profissionais da área, como nutrólogos veterinários, especialistas em nutrição animal e zootecnistas. Além de tratar as doenças no trato intestinal do pet, o transplante de fezes também vai prevenir outras patologias, já que melhora o metabolismo do sistema imune.
Veja como seu cachorro ou gato pode ser doador em transplantes de microbiota fecal
Há outra dúvida muito comum sobre o transplante de fezes: quanto custa. Como essa é uma prática recente entre os veterinários, o valor da terapia pode variar. É importante buscar profissionais que tenham experiência nesse tipo de tratamento. Agora se você quer saber como tornar seu cachorro um doador de fezes, é importante prestar atenção em algumas regrinhas:
- ser saudável
- estar com as vacinas em dia
- estar vermifugado
- não pode estar acima ou abaixo do peso ideal para um cachorro ou gato
- ter boa condição intestinal, com uma microbiota equilibrada
- não ter nenhuma doença
- não ter histórico de giardíase e verminoses
É importante também que o cachorro ou gato siga uma dieta sem transgênicos, conservantes, palatabilizantes e corantes. Ou seja, cuidar da alimentação do pet é fundamental para que ele possa ser doador de fezes, escolhendo uma ração de qualidade e evitando os alimentos proibidos para cachorro e felinos.
Redação: Erika Martins
Edição: Luana Lopes